domingo, 23 de janeiro de 2011

miniconto. republicando com uma pequena modificação


O bar era perto. Passava das 23h. Os dois precisariam acordar bem cedo mas, bia bebia e
Balançava a cabeça, o pescoço, os quadris, o corpo todo em sintonia com a música frenética, e falava, e gritava, e repetia ao mesmo tempo:
-Será que a dança é algo pra fazer a gente não se envelhecer?
Ele ficara todo o tempo sem dizer nada, com os olhos fechados, rodopiando no compasso da velha amiga que, sorrindo, passaria a pensar naquilo pra sempre.
Naquele momento ela sussurra maliciosamente bem pertinho de sua orelha :
- É... acho que você concorda comigo.

dudu lima tocando com stanley jordan no palacio das artes
foto : isaias

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Miłosz


Os meus ouvidos escutam cada vez menos as conversas, os meus
[olhos enfraquecem, continuando porém insaciados.

Vejo as pernas delas de mini-saia, de calças,
[ou de tecidos vaporosos,

Espreito cada uma, os seus rabos e coxas, pensativo,
[embalado por sonhos porno.

Ó lascivo velho jarreta, estás com os pés para a cova
[e não para os jogos e brincadeiras da juventude.

Mas não é verdade, faço apenas aquilo que sempre fiz,
[compondo as cenas desta terra, movido pela
[imaginação erótica.

Não desejo justamente estas criaturas, desejo tudo,
e elas são como um sinal de convívio extático.

Não tenho culpa de sermos feitos assim, metade de
[contemplação

desinteressada e metade de apetite.

Se depois de morrer for para o Céu, lá, terá de ser como aqui,
apenas hei-de livrar-me dos sentidos entorpecidos
[e dos ossos pesados.

Transformado em puro olhar, continuarei a absorver
[as proporções
do corpo humano, a cor dos lírios, a rua parisiense
[na madrugada de Junho.
Enfim, toda a inconcebível, a inconcebível pluralidade
[das coisas visíveis




Czesław Miłosz (poeta polonês)

pasternak


Ser famoso...


Ser famoso não é bonito.
Não nos torna mais criativos.
São dispensáveis os arquivos.
Um manuscrito é só um escrito.



O fim da arte é doar somente.
Não são os louros nem as loas.
Constrange a nós, pobres pessoas,
Estar na boca de toda a gente.



Cumpre viver sem impostura.
Viver até os últimos passos.
Aprender a amar os espaços
E a ouvir o som da voz futura.



Convém deixar brancos à beira
Não do papel, mas do destino,
E nesses vãos deixar inscritos
Capítulos da vida inteira.



Apagar-se no anonimato,
Ocultando nossa passagem
Pela vida, como a paisagem
Oculta a nuvem com recato.



Alguns seguirão, passo a passo,
As pegadas do teu passar,
Mas tu não deves separar
Teu sucesso do teu fracasso.



Não deves renunciar a um mínimo
pedaço do teu ser,
Só estar vivo e permanecer
Vivo, e viver até o fim.





boris pasternak (poeta russo)

domingo, 9 de janeiro de 2011

poema


Um pouco
Da estrada cheia de
Algoz

(Pensa a dias nisso)

Vibra sua boca silente

Da ponte

Passar

Comboios de
Tudo que deixou









foto e poema : isaias